O dia em que fui Ronaldo

Você já deve ter lido/ouvido/falado que no Brasil todo garoto sonha em ser jogador de futebol, certo? No meu caso, não foi diferente. Um atacante esforçado, que já completou boas peladas. Mas logo reconheceu que o negócio era mesmo estudar. Ser jogador de futebol, senhores, parece fácil, mas não é. Muitos são. Nós, crueis, só vemos os craques. Só vemos os Ronaldos. E não é fácil ser Ronaldo. Pois bem, nesta terça, eu fui, por um dia.

Esqueça as cartas; use a cabeça

O Poker já foi reconhecido como esporte da mente e já se provou ser muito mais um jogo de estratégia que de sorte. Eu diria que é um xadrez com baralho e fichas. Qualquer um, munido de 52 cartas e até mesmo um punhado de feijões, pode jogar. E se eu nunca pisarei como jogador (como narrador, já tive essa honra) num Maracanã lotado, com Ronaldo ou outros craques ao lado e contra, no feltro, isso é possível.

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Visitando a minha querida Curitiba, entre um almoço de família e um papo com os velhos amigos, fui convidado a jogar um torneio na Liga Curitibana, um dos melhores clubes de poker do Brasil. Torneio bom, interessante, com inscrição a R$ 100 e prêmio beirando os 5 mil reais pra quem superar a maratona de dois dias de disputa. Ronaldo não estava lá, mas o campeão brasileiro João Paraná sim. E outras feras da cidade. Pra quem não sabe, Curitiba é celeiro do Poker tanto quanto do MMA. No octógono, Vanderlei Silva, Anderson Silva, Maurício Shogun e outros; no feltro, Alexandre Gomes – o primeiro brasileiro campeão mundial -, Alex Gelisnki, Gustav Langner e tantos outros.

O poker coloca você, um mero interessado, frente a frente com verdadeiras cobras. Salvo quem tem vínculo familiar, qual a chance de se jogar um campeonato com os craques de outros esportes? Você subiria no octógono com Anderson Silva? O poker é mais seguro e, como se diz no meio, “você só precisa ter uma ficha e uma cadeira para jogar.”

Confesso que sou mais que um iniciante. Já li alguns livros e fiz até alguma graça, sendo 5o colocado no BSOP Curitiba Last Chance, há uns 2 anos. Nada que dê para largar o jornalismo (como se eu conseguisse…) mas serve pra ter no curriculo. E durante um bom tempo, achei que iria faturar mais essa. Estava bem, concentrado, jogando firme. Construí um stack (o volume de fichas acumuladas) de 48 mil a partir das 12 mil que comecei. Juro que me vi na final. Ronaldo deve ter passado por isso em 1998.

De boné e óculos escuros: estilo tem, só falta jogo (Foto: Felipe Costa)

Muricy Ramalho costuma dizer que “a bola pune”. O baralho, amigo, não é muito diferente. Poker é acima de tudo habilidade – quase todas as fichas que ganhei até então foram sem showdown, ou seja, sem necessidade de apresentar as cartas. Estava orgulhoso até. Confiante. Talvez em excesso. Cometi um erro de avaliação e, em um segundo, metade das fichas foram embora. Paciência, um dos segredos é não reclamar. Pouco depois, já meio recuperado, encontro um adversário em melhor situação – desta vez ele teve um pouquinho de sorte, mas dava pra ter evitado um choque maior. Por fim, já no final do dia classificatório, tive que arriscar tudo com um par de seis e, azar meu, achei um adversário com par de damas. O baralho não ajudou e de novo me vi como Ronaldo em 98.

Mas de Ronaldo – e do poker – dá pra se tirar algumas lições. A primeira é não desistir nunca. Sempre há outra mão, outro dia, outro começo. A segunda é deixar as coisas menos na mão da sorte e trabalhar dobrado. E a terceira é se divertir. Afinal, acima de tudo, é esse o espírito.

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O erro de Vinícius

E se fosse outro goleiro que tivesse protagonizado o lance incomum em Criciúma 1-2 Atlético? Fiquei pensando nisso após o fim da partida. Se não fosse Vinícius que estivesse no gol, será que a reclamação seria unânime na hora do lance? Será que a grita dos torcedores e de grande parte da imprensa local seria diferente? Pra mim, sim.

Vinícius é estigmatizado por aqui. Tudo ainda por um erro de quatro anos atrás, que custou ao Atlético o título paranaense contra o Coritiba. Na época, 2008, um choque entre Vinícius e o então zagueiro Danilo proporcionou que Henrique Dias descontasse para o Coxa, que havia vencido o jogo de ida por 2-0. O gol de HD deixou o placar em 2-1. O Atlético venceu, mas não levou. E Vinícius ficou marcado para sempre.

Sem carregar a mesma cruz nacionalmente, a análise da imprensa nacional foi mais objetiva: o árbitro José de Caldas Souza (DF) errou grosseiramente. “Erro primário”, analisou Leonardo Gaciba, ex-árbitro e comentarista de arbitragem do SporTV. No lance, o auxiliar Marrubson Melo Freitas levantou a bandeira na hora, mas Caldas bancou o lance e prejudicou o Atlético. Veja o lance, uma entrevista de Vinícius e a análise de Gaciba, no vídeo abaixo:

Por aqui, deu-se mais atenção à “mosqueada”de Vinícius. Eu, inclusive, tive dúvidas no lance, muito rápido. Mas admito que tive dúvidas na aplicação da regra, que na verdade não é nada interpretativa. É só ler o trecho abaixo, extraído do livro de regras do futebol da CBF:

O goleiro não deverá manter a posse da bola em suas mãos por mais de seis segundos. O  goleiro estará de posse da bola:

• enquanto a bola estiver em suas mãos ou entre sua mão e qualquer superfície (por exemplo: o solo, seu próprio corpo)

• enquanto segurar a bola em sua mão aberta estendida

• enquanto bater a bola no solo ou lançá-la ao ar

Quando o goleiro controlar a bola com suas mãos, nenhum adversário poderá disputá-la com ele.

Não há dúvidas: o árbitro errou gravemente e prejudicou o Atlético. É só rever o lance: Vinícius está com a mão estendida enquanto Zé Carlos retira a bola com a cabeça. Falta do atacante, que custou caro ao Furacão.

Sim, caro. Porque o time poderia ter conseguido a vaga para a outra fase da Copa do Brasil ainda ontem. Agora terá que disputar uma nova partida. Acredito que a vantagem de poder perder por 0-1, empatar e vencer, seja boa o suficiente para que o Atlético confirme a vaga, mas terá um desgaste de um jogo a mais na reta final do Paranaense. E qualquer jogo a mais, um cansaço a mais, no futebol moderno, é inchaço de calendário, dificuldade de recuperação, treinamento a menos. O Atlético deve cobrar da CBF uma postura contra a arbitragem.

Mas, e Vinícius? O goleiro foi condenado antes mesmo de uma noção maior das regras. “Vinícius não serve”, “Um erro infantil”, e outras críticas. E assim foi por 2008, não por 2012. Qualquer outro goleiro na meta e, estou convencido, todos seriam mais complacentes com o jogador e menos com o árbitro. O lance passaria de “duvidoso” para “absurdo”.

Vinícius não é o goleiro ideal para o Atlético. Ontem mesmo falhou em outros dois lances, uma furada com os pés em uma saída de bola no primeiro tempo e um “bate-roupa” no segundo,  do qual se recuperou a tempo. Mas ele deve ser julgado pelo que vem fazendo, não pelo que errou antes. O Atlético não precisa de um Barbosa* no gol.

Curiosidade

Foi impossível ver o lance e não lembrar da micagem de Rodolfo Rodrigues pelo Bahia, contra o Cruzeiro de Ronaldo, em 1993. Relembre o lance, validado pelo árbitro:

*Barbosa foi o goleiro da Seleção Brasileira de 1950, que perdeu a decisão para o Uruguai em um Maracanã lotado, 1-2. Ele fez parte de um dos mais vitoriosos times da história do Vasco, o Expresso da Vitória, seis vezes campeão carioca entre 1945 e  1958 e campeão do Sul-Americano 1948, o embrião da Taça Libertadores. Barbosa era um exímio goleiro, mas carregou por toda a vida o estigma de ter falhado no gol de Ghiggia, o do título uruguaio. A bola passou entre ele e a trave em um chute a queima-roupa. Mas a falha foi mesmo da zaga, que não fez a cobertura correra. Barbosa morreu em 2000 aos 79 anos, depois de, como ele mesmo dizia, “cumprir uma pena de 50 anos, maior que a de qualquer criminoso julgado pela Justiça no Brasil.”